REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E ATUAL CENÁRIO NO PAÍS
A regularização fundiária é também um instrumento para promoção da cidadania, devendo ser articulada com outras políticas públicas. No Brasil, o tema está em evidência. Na Bahia, trouxemos informações sobre a atual situação dos assentamentos de terra e como estão as políticas voltadas para o cadastro de imóveis rurais e urbanos.
Qual a importância da regularização fundiária no nosso país, principalmente neste momento?
No meu entendimento, é um dos principais requisitos para o desenvolvimento socioeconômico e ambiental sustentável em nosso país. Seja na aplicação de políticas sociais, fiscais ou de infraestrutura,
pois além de permitir o direito de propriedade para famílias sensíveis do ponto de vista social, possibilita a execução de grandes projetos de infraestrutura e de desenvolvimento regional.
Este tema nunca esteve tão em evidência no Brasil quanto nos últimos dois anos. E isto se deve muito a necessidade de preservação e combate ao desmatamento ilegal na Amazônia, e ao dever dos municípios de buscar uma autonomia orçamentária a partir da regularização fundiária urbana, com consequente aumento na arrecadação de tributos.
Desde 2009, o Governo Federal vem atuando diretamente na regularização das ocupações em terras públicas na Amazônia Legal e, com a publicação da Lei nº 11.952/2009, através do Programa Terra Legal, buscou regularizar centenas de milhares destas áreas, mas sem muito sucesso durante os anos de vigência do programa.
Em 2019, com a publicação da Medida Provisória nº 910, o Governo Federal propôs alterações das regras para regularização fundiária de imóveis da União ocupados irregularmente, e estabeleceu
novos critérios para a regularização fundiária desses imóveis, incluindo assentamentos ocupados até maio de 2014 e com área de até 15 módulos fiscais.
À época, o Brasil estava sofrendo duras críticas de entidades preservacionistas e de órgãos internacionais por não conseguir conter o aumento das queimadas na Amazônia e a MP nº 910 não
conseguiu um ambiente político adequado para sua votação e consequente transformação em Lei.
Uma das principais consequências da perda de validade da MP nº 910 foi a recriação do Conselho Nacional de Proteção da Amazônia Legal para coordenar ações de preservação e de desenvolvimento
sustentável na região. Sob a liderança do Vice-Presidente da República, o General Hamilton Mourão, foi implementada a Operação Verde Brasil, que visou coibir crimes ambientais na faixa de fronteira, unidades de conservação e terras indígenas. Esta operação está em sua realização e deverá
servir de base para criação do Plano Amazônia, para estabelecer diretrizes de combate aos ilícitos ambientais e fundiários.
Atualmente, circula no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 510/2021, que visa resgatar as propostas colocadas na MP nº 910. Considerando o ambiente político atual, apresenta grandes chances de lograr êxito em sua aprovação. A política fundiária rural, ora priorizada na região amazônica, deve ser estendida para todo território nacional e atender as várias realidades de nosso imenso país.
Para a regularização fundiária urbana, o destaque vem com a publicação da Lei nº 13.465/2017, que trouxe importantes avanços para a regularização das ocupações nos centros urbanos, oferecendo
maior autonomia aos gestores municipais para aplicação de procedimento que visam a Regularização Fundiária Urbana (Reurb). Ela consiste num conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à
titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia e o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana.
Em 2019, o Ministério do Desenvolvimento Regional apontou que 50% dos imóveis urbanos no país não possuem escritura. Esse é o tamanho do problema a ser enfrentado em todos os 5.570 municípios brasileiros, o qual precisa de preparo e proatividade dos gestores públicos para sua efetivação e consequente promoção de melhoria nos ambientes urbanos e aumento da arrecadação tributária.
Qual a atual situa ção da Bahia em relação a este tema?
Considerando os dados do cadastro de imóveis rurais da Receita Federal em 2015, o estado da Bahia contabiliza o maior número de imóveis rurais no país, com mais 1,3 milhões, e a capital Salvador, segundo a Prefeitura, apresenta um nível de irregularidade dos imóveis urbanos na ordem de 70%.
O cadastro de imóveis rurais certificados pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária – Incra/BA, apresenta pouco mais de 36 mil imóveis rurais em sua base de dados, cobrindo cerca de 30% do território do estado.
Diante desse cenário, podemos afirmar que há muito por fazer, principalmente no desenvolvimento das ações de regularização fundiária das ocupações rurais. Esta ação está sob a responsabilidade da Coordenação de Desenvolvimento Agrário – CDA, vinculada a Secretaria de Desenvolvimento Rural – SDR, que nos últimos anos vem realizando muitos investimentos em tecnologia e parcerias com os consórcios municipais e cartórios de registro de imóveis. Apesar de todo esforço do Governo Estadual, parece não dar vazão à demanda apresentada, e isso pode ser explicado pela natureza jurídica do órgão, o qual não apresenta uma autonomia como a dos demais institutos de terras de outros estados.
Em 1999, o Decreto nº 7.578, extinguiu o Instituto de Terras da Bahia – Iterba, que à época era uma autarquia vinculada à Secretaria da Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária. Para atender a todo passivo de regularização fundiária e chegar a maior parte dos pequenos agricultores rurais do estado, é preciso recriar o antigo Iterba e recompor a força de trabalho através de concurso público, colocando esta política de estado como prioridade de governo.
Voltando para a capital, as últimas gestões municipais trataram do assunto com alta prioridade, realizando grandes investimentos em tecnologia, infraestrutura, pessoal qualificado para atuar no mapeamento cadastral dos imóveis e atualização da planta genérica de valores, que geraram números recordes na arrecadação do Imposto Predial Territorial Urbano – IPTU.
Uma das principais ações foi definir todo território que seria considerado urbano, o que gerou alguns conflitos entre a legislação agrária e de uso do solo urbano, fazendo com que imóveis rurais passassem a ser tributados como urbanos e gerando valores altíssimos na cobrança do IPTU.
A Prefeitura de Salvador, juntamente com os Cartórios de Registro de Imóveis, já aplica os procedimentos previstos na Reurb para regularizar os diversos núcleos informais no município
e assim possibilitar mudanças do ponto de vista urbanístico, social, ambiental e econômico na capital.
Qual o atual cenário dos assentamentos de terra no estado da Bahia?
A Bahia possui cerca de 700 Projetos de Assentamentos Federais e um nível de regularização na ordem de 20%. Há um passivo enorme a ser trabalhado pelo Incra na Bahia, visando atender
milhares de famílias através da titulação dos lotes inseridos nos assentamentos rurais.
Desde 2019, o Instituto vem investindo fortemente nas ações de titulação e uma delas é justamente a elaboração de projetos de parcelamento que, através do georreferenciamento, possibilitam a demarcação dos lotes e emissão dos títulos de domínio as famílias assentadas.
Neste ano, a superintendência do Incra na Bahia instituiu um Núcleo de Inteligência e Planejamento – NIP para auxiliar a gestão no desenvolvimento das ações de titulação de lotes de Projetos de Assentamento e Regularização Fundiária em Glebas Federais. Este já é um passo importante para melhorias no atual cenário.
Como o uso de novas tecnologias vem contribuindo para a realização dos serviços de cartografia?
Sem sombra de dúvidas, a utilização dos Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas – RPAS, mais conhecidos como Veículos Aéreos Não-Tripulados – Vants e Drones vem causando uma verdadeira revolução no mapeamento de alta precisão em áreas rurais e urbanas. As possibilidades de uso são bem diversas, possibilitam uma melhor compreensão da topografia dos imóveis e potencializam as ações de regularização fundiária de forma massiva.
Destaco também o Posicionamento por Satélites Artificiais GNSS, denominada de PPP-RTK para fins de Georreferenciamento de Imóveis Rurais. O uso dessa técnica permite alcançar a acurácia em torno de 2,5 cm em Tempo Real, no Sistema de Referência oficial do país (SIRGAS2000), com a utilização
de apenas um receptor GNSS. A integração do PPP-RTK com outras representa diminuição de custos e aumento da produtividade para as empresas e profissionais de geotecnologias, que podem utilizar em serviços de mineração, construção civil, rodovias e ferrovias, georreferenciamento de imóveis rurais, entre outras aplicações.
Como tem sido o mercado de trabalho neste momento de pandemia, e o que o senhor destaca na sua área de atuação?
Diferente de outras profissões e segmentos de mercado, a área das geotecnologias seguiu bastante atuante durante este período. A “Pesquisa sobre Mercado de Geo”, realizada pelo blog AnáliseGeo no período de julho a agosto de 2020, constatou que 88,7% dos entrevistados continuaram trabalhando durante a pandemia de Covid-19 e quarentena, iniciada em março do mesmo ano.
O segmento se manteve relativamente estável durante a pandemia e, em alguns serviços, foi registrado um aumento significativo. Segundo dados do Sigef, no período de março a agosto de 2020, foram registradas mais de 60 mil certificações de imóveis rurais através do sistema, cerca de 10% de todos imóveis já certificados em todo país desde 2013.
Na minha área de atuação, destaco a atualização profissional como um dos pilares do profissional das geotecnologias, bem como o aprimoramento das técnicas de marketing e vendas dos serviços especializados, pois muitas vezes os nossos clientes não sabem que precisam do nosso trabalho.
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